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Epigrama

do grego ἐπί-γραφὼ
‘sobreescrever’

epigramas por Vera Faias Fonseca
fotografias com Vera Faias Fonseca, por Mariana Castro

 

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho  Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de CarvalhoEpigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

Epigrama um

Uma boca abre-se e segreda: as côdeas e os muros.


Epigrama dois

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

Em dias de meteorologia endócrina incerta e difusa, deveria ser possível dobrar a alma, de forma bem minuciosa, replicando dobra atrás de dobra, de forma a eliminar qualquer vestígio de aresta e ângulo obtuso. Depois, já reduzida à sua condição de mínimo, enquadrá-la do avesso: um alvéolo pulmonar, uma válvula cardíaca seriam moradas adequadas. Do lado exterior, ficaria, portanto, um corpo sem alma. Os mais desatentos descalçariam os sapatos e ficariam de pés nus à beira de um simulacro.

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

 


Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

Epigrama três

Sabes que para o pão te assentar bem no estômago tens de digerir o magma e aplacar as aporias.
Tu és a de trás e a de diante.

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

 


Epigrama quatro

Mondar a alma. Retirar-lhe nós e impurezas. Tudo aquilo que faz travar-lhe o mundo na garganta. Seria isso que fazia a minha mãe e todas aquelas mulheres agachadas de sol a sol? Mondar a alma, delas e do mundo. Terei eu herdado dela, além das varizes, o peculiar labor de arrancar das entranhas longas frases cheias de nada? Para, rasgando a terra uma e outra vez, alcançar o fundo da palavra única, muda e indizível. Como uma tormenta aplainada.

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

 


 

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

Epigrama Cinco

As côdeas e os muros. É preciso caiar tudo vez e vez sem fim. Por cada demão dada, um horizonte empurrado para a orla do Amanhã. As mulheres de corpo franzino e pele torrada sobem nas suas escadas. O sol apieda-se e as suas mãos, diferentemente de Ícaro, tornam-se asas inelutáveis.

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

 

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

 

 

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

 


Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

Epigrama seis

E um corpo em movimento continua a ser a mais perfeita morada para tecer estórias, teorias, efabulações. Num hálito sustido, o frémito da incandescência abre-se a cílios e células. Os músculos, antes contraídos de hesitações, dilatam agora a precisão do incerto. Valha-nos aquilo que não sabemos.

 

 

 

 

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

 

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

 

 

 

 

 

Epigrama, fotografia por Mariana Castro, com Vera Faias de Carvalho

é fotógrafa e realizadora, estudou Cinema e fez Mestrado em Filosofia, Estética, desenvolvendo ainda investigação em Fotografia. Filmou em festivais de cinema internacionais, integrou a exposição do MNAC em 2015 e o seu filme "Maria Lucília Moita" encontra-se patente no MIAA, Abrantes. Retratou as cabines de projeção de cinema de Lisboa em 2017 e tem fotografia publicada em edições como “A Torção dos Sentidos” (Documenta, 2020).

é licenciada em Línguas e Literaturas Clássicas pela FLUL e doutorada em Estudos Visuais e de Género pela Universidade de Utrecht com uma tese sobre a obra da pintora Paula Rego. Leitora do Instituto Camões na Universidade de Estocolmo e conselheira cultural na Embaixada de Portugal, viveu anteriormente nos Países Baixos e Chile. Tem particular interesse pelos cruzamentos artísticos entre imagem, movimento e texto, quer no campo da docência e investigação, quer no campo da criação.

Número #03
1. Epigrama
2. Agon
3. Umbigo
4. Sombras
5. Herbário
6. Reading and Call for Work: Colors for Baby
7. Mariana
8. asas
9. [uma estética onde a sujidade, a destruição e o caos estão muito presentes]
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